Como desdobramento da Operação Assepsia, deflagrada em Iporá
dia 19 de dezembro, o Ministério Público de Goiás (MP-GO) denunciou à Justiça,
na última quinta-feira (22/12), o secretário de Obras de Iporá, Cleidney José
Silva; o secretário de Controle Interno de Iporá, Donizete Vieira de Souza;
Edney José Silva, irmão de Cleidney e José Santana Leite, dono da empresa
Transterra. Eles foram denunciados pelos crimes de peculato, lavagem de
dinheiro, organização criminosa e por embaraço às investigações. A denúncia foi
assinada pelos promotores de Justiça Vinícius de Castro Borges, da 1ª
Promotoria de Justiça de Iporá; José Eduardo Veiga Braga Filho, em plantão na
comarca de Iporá; e Mário Henrique Cardoso Caixeta, do Grupo de Atuação
Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco/MP-GO).
A Operação Assepsia apurou a prática de crimes relacionados
a fraudes na execução de serviços de limpeza em Iporá. Foram cumpridos três
mandados de prisão preventiva e três de busca e apreensão, que resultaram na
coleta de documentos, computadores e materiais relacionados aos delitos
investigados. Os mandados foram expedidos pelo juiz João Geraldo Machado, que
atua em auxílio à 2ª Vara da Comarca de Iporá e executados por promotores e
servidores do Ministério Público, com auxílio de policiais militares e civis.
De acordo com a denúncia, entre maio de 2013 e dezembro de
2016, a empresa José Santana Leite ME, de nome fantasia Transterra, de
propriedade do denunciado José Santana Leite, firmou contratos administrativos
de prestação de serviços com o município de Iporá, para coleta e transporte de
galhos e gramas recolhidos nas ruas e avenidas da cidade, atendendo a
Secretaria Municipal de Obras. Os editais da licitação que precederam as
contratações exigiam que o contratado possuísse caminhão com carroceria aberta,
motorista e quatro operadores para carga e descarga. Todas as despesas
correriam por conta do contratado, incluindo manutenção do veículo, motorista,
operadores, obrigações sociais, tributárias e previdenciárias, combustível e
outras. O pagamento estava condicionado ao número de viagens que fossem
realizadas.
O esquema
Durante as investigações do MP, ficou apurado que a
Transterra foi registrada em março de 2013, que não possuía em seu objeto
social a atividade de locação de veículos com motorista, não possuía
instalações físicas no endereço informado e nenhum veículo ou funcionário
registrado. O caminhão usado em todo o período do contrato, um Mercedes Benz
azul, placa KBJ-5004, estava registrado em nome da companheira de José Leite.
Foi provado pelas investigações que o caminhão teve como
base de operação e pernoite a garagem da Prefeitura e que trabalhavam nele
servidores contratados pelo município. Durante o cumprimento dos mandados de
busca e apreensão, foram encontradas requisições de combustível para o caminhão
assinadas pelo secretário de Obras, Cleidney Silva, inclusive com data de
janeiro de 2013, anterior à celebração do contrato, o que indica possibilidade
de direcionamento de licitação. Depoimentos colhidos de testemunhas mostraram
que a manutenção do caminhão era realizada na garagem da Prefeitura, por
mecânicos do município, conforme solicitações assinadas pelo secretário de
Obras e apreendidas durante a operação.
Ficou ainda provado que o contador responsável pela
Transterra era o secretário de Controle Interno, Donizete Vieira Souza que,
pelo cargo que exerce, é quem deveria fiscalizar o cumprimento do contrato e a
efetiva prestação dos serviços. Durante os mandados de busca, foram encontrados
blocos de notas fiscais da Transterra no escritório de contabilidade de
Donizete Vieira. Em algumas das notas fiscais preenchidas constavam apenas o
valor de R$ 15.400, relativos à coleta e transporte de galhos e gramas, sem
qualquer menção ao número de viagens realizadas, elemento indispensável ao
pagamento pela Prefeitura, conforme previsto no contrato.
Também foram apresentadas provas de que os funcionários que
trabalhavam na coleta e transporte de galhos eram pessoas contratadas e pagas
pelo município de Iporá, sem concurso público, mediante indicação do secretário
de Obras, Claudney Silva, já que a Transterra não possui qualquer funcionário
registrado. O próprio dono da empresa, quando ouvido pelo Ministério Público,
declarou não conhecer as pessoas que trabalhavam em seu caminhão.
Segundo a denúncia, todo o valor pago por mês à empresa de
José Santana Leite é indevido, tratando-se de fórmula adotada para desvio do
dinheiro público, pois ao mesmo tempo que o município paga a empresa pela
execução dos serviços, o próprio município executa, com seus recursos, os
trabalhos que havia contratado. Assim, o serviço é pago em duplicidade pelos
cofres públicos municipais, que arca com o pagamento da empresa e com o
pagamento de serviços de manutenção, combustível, funcionários e guarda do veículo.
Apropriação de salários
Foi apurado ainda, em consulta ao Portal da Transparência de
Iporá, grande diferença entre os valores efetivamente pagos pela Prefeitura e
aqueles informados pelos contratados, que recebiam entre R$ 800 e R$ 1 mil
mensais. Eles recebiam estes valores em dinheiro e assinavam recibos por eles
na Secretaria de Obras. Mas no Portal da Transparência constava que os valores
pagos pela Prefeitura eram, em média, de R$ 2,6 mil, ocorrendo meses
esporádicos em que os cheques emitidos eram de R$ 4,5 mil e R$ 7,9 mil.
Nos dias de pagamento, Cleidney Jose Silva e Donizete Vieira
de Souza levavam os contratados até a agência da Caixa Econômica Federal para
que descontassem os cheques emitidos pelo município. Após descontados os
cheques, os funcionários da Secretaria de Obras repassavam todo o valor aos
dois que, no final do dia, normalmente na garagem da Secretaria de Obras,
repassavam aos contratados o valor de R$ 1 mil, apropriando-se da diferença de
R$ 1,6 mil por funcionário.
Nas investigações realizadas por meio de interceptações
telefônicas autorizadas judicialmente ficou evidenciada a influência de Edney
José Silva, irmão do secretário de Obras, no esquema. Apurou-se que parte do
dinheiro subtraído pelos demais denunciados era repassado a Edney Silva e a
pessoas indicadas por ele, para dissimulação de origem dos valores. Entre
algumas das conversas interceptadas, Edney conversa com a secretária de
Donizete Vieira e cobra o repasse de valores provenientes do contrato de José
Leite; informa ao dono da Transterra data e valor a menor da nota fiscal dos
serviços que será emitida; combina com José Leite de conversarem pessoalmente
para orientá-lo sobre o que dizer no interrogatório no Ministério Público; além
de informar a José Leite número de contas de terceiros para depósito de
valores.
As interceptações telefônicas revelaram ainda que Donizete e
Cleidney contataram testemunhas que seriam ouvidas no Ministério Público para
que estas omitissem o repasse de valores aos denunciados, bem como para que
dissessem que a diferença nos valores pagos pelo Município seria em razão da
quantidade de horas trabalhadas, dentre outras orientações. Segundo o MP, os
denunciados subtraíram dos cofres públicos de Iporá, pelo menos, R$
1.071.163,50.
Desse total, R$ 621.866,05 foram desviados por meio de
pagamentos indevidos mensais à empresa de José Santana Leite, em razão da
execução fraudulenta do contrato de prestação de serviços de limpeza, pagos
pelo município de Iporá. Além desses valores, outros R$ 449.297,45 foram
subtraídos por Donizete Vieira, Cleidney Silva e Edney Silva por meio do
desconto de cheques emitidos pelo município em pagamento a servidores públicos
contratados, tendo eles se apropriado de significativa parte desses pagamentos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário